sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Despedida de uma amiga


Era uma paixão guardada até que um dia chegou a hora. Depois de duas L200 compradas do jeito que deu, poderia aproveitar os bons ventos e o mar tranquilo do final de 2009 para chegar de vez onde queria. E lá estava ela, amarela, em um canto da loja. Não precisava ficar em lugar de destaque porque, de onde você olhasse, ela se sobressaia. Negócio fechado e, por ironia do destino, quem vai pegar o carro zero na loja é a Cristina e Letícia. Até hoje não esqueço a seguinte cena.
Parado no sinal do Largo da Batalha, voltando para casa para enfim ver o carro novo, de repente cruza na minha frente uma Savana amarela, andando rápido. Igual a minha, penso eu. Um olhar mais atento e ... Cristina e Letícia dentro dela? É a minha! E as duas já tirando casquinha por aí. Justiça seja feita, elas estavam resolvendo os problemas de emplacamento e, depois de idas e vidas, deu tudo certo.
O carro novo já tinha uma missão. Para janeiro estava programada minha primeira viagem internacional de carro e o destino seria a meca dos amantes do off road. San Pedro do Atacama, no Chile, e todos os seus desafios. O grupo pequeno de quatro carros cumpriu rigorosamente a programação e, no final, ficaram as boas lembranças nas andanças a mais de 4000 metros de altura, do frio e da baixa umidade local. De Salta, trouxemos belas recordações.
Minha companheira, então, enfrentou forte rotina diária no deslocamento diário Niterói-Barra da Tijuca e nos fins de semana nas atividades off road. Em uma dessas, uma manobra inábil de um competidor fez com que ela fosse para o estaleiro para reparo de lataria nas portas, ficando a certeza de que rali do Carioca Off Road não era atividade recomendada para ela.
O odômetro rodava rápido e 2011 chegava para a realização da Expedição Brasil Transamazônica. O grupo já um pouco maior de seis carros superou sem maiores dificuldades os desafios de percorrer 9000 km passando por nove estados e por rodovias emblemáticas no off road. A Transamazônica e a Cuiabá-Santarém. Depois de 20 dias de viagem, uma boa lavagem, e já estamos prontos para voltar à rotina do dia a dia.
Para 2012 os desafios são bem maiores. Primeiro uma ida ao Sul do Brasil para conhecer Gramado-Canela e os Canions Fortaleza e do Itaimbezinho. Depois, a Serra do Rio do Rastro. Em seguida vem aí a Expedição Biomas da América do Sul. Deslocamento até o Acre para, então, vencer as alturas dos Andes com 4850 metros de altura no trecho Porto Maldonado – Macchu Picchu. Forte e valente nos levou com segurança ao encontro de nossos companheiros, prosseguindo, assim, ao Lago Titicaca e, em seguida, descendo ao Oceano Pacífico. A variação de altura ia de 4000 metros até o nível do mar não nos trazia nenhuma preocupação. Mais uma passagem pelo Deserto do Atacama e Salta. As recordações são registradas em belíssimas imagens. Encerramos o ano com uma expedição ao Pantanal Sul, andando muito no verdadeiro off road e admirando a natureza bem de perto
Chegamos a 2013 com 121231 km rodados e já somos bem íntimos, conhecendo bem as limitações de cada um. A programação para o ano seria uma viagem com Cristina a São Miguel das Missões, muito bela e carregada de valores históricos, que nos deixou uma gostosa sensação de que precisamos voltar novamente. Mais uma expedição ao Pantanal, agora cruzando do Sul para o Norte, acampando nas fazendas, andando por imensos areais e, depois de descer de balsa cerca de 50 km do rio Piquiri, ingressar na Transpantaneira e sua infinidade de pontes. O ano está acabando do alto de seus 155889 km. Já precisamos pensar em dar um descanso para minha amiga. Que tal reservá-la apenas para os momentos de lazer e deixar as tarefas do dia a dia para alguém com perfil mais apropriado? Será feito.
Se agora a prioridade é o lazer, vamos começar com uma viagem a Montevidéu em fevereiro de 2014. Muita distância e pouco off road, mas serviu como aperitivo a um dia fazer os 250 km entre Chuí e Rio Grande pelas areias da praia. Este dia está chegando. No segundo semestre, o Jalapão é o destino e lá vamos nós cruzando a Caatinga do interior da Bahia para depois usufruir das cachoeiras e fervedouros do Cerrado do Jalapão, em Tocantins. São cerca de 174000 km rodados e, pela primeira vez, paramos na estrada por um motivo que não foi ajudar os outros. Desta vez, um pneu furado – o primeiro em uma expedição iria atrasar nossa chegada a Natividade, ainda no Tocantins. Nada de grave e chegamos a Niterói sem maiores problemas.
Enfim chegamos a 2015 e meus projetos de viagem continuam com objetivos cada vez mais longínquos. Mas minha amiga está ficando cansada, chegando na casa dos 185000 km. Por mais que tenha cuidado na manutenção, certas surpresas podem acontecer e, estando muito longe de casa, a solução pode não ser tão simples. Está chegando a hora. Passeios, trabalho, ralis, expedições, tudo vai ficar na lembrança. Asfalto, areia, barro, paralelepípedo, rípio, cascalho e rios, com lama ou sem lama, nas altas alturas ou ao nível do mar, com muita gente junta ou sozinhos, só nós dois. Vencemos tudo juntos.
Você continuará com alguém que saberá respeitar suas limitações e aproveitarão juntos ótimos momentos. Que no futuro nos encontremos em alguma trilha por aí.

                                                                                                          Sergio